Sem citar Renan, Cármen Lúcia exige respeito aos juízes do Brasil


A presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministra Cármen Lúcia, rebateu as críticas feitas pelo presidente do Senado, Renan Calheiros, ao juiz Valisney Souza de Oliveira, que autorizou a prisão do chefe da Polícia Legislativa do Senado, Pedro Carvalho. Nesta segunda (24), Renan chamou o magistrado de “juízeco”.
Em sessão do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) nesta terça (25), Cármen Lúcia exigiu respeito ao Judiciário e disse que, a cada agressão a um juiz, ela própria se sente agredida.
“Queremos também, queremos não, exigimos o mesmo e igual respeito para que a gente tenha democracia fundada nos princípios constitucionais […]. Todas as vezes que um juiz é agredido, eu, e cada um de nós juízes é agredido. E não há a menor necessidade de, em uma convivência democrática livre e harmônica, haver qualquer tipo de questionamento que não seja nos estreitos limites da constitucionalidade e da legalidade”, afirmou, sem citar Renan nominalmente.
A ministra, que também preside o CNJ, afirmou que todos os magistrados são passíveis de erros, como qualquer ser humano. Disse, no entanto, que não admite a tentativa de desmoralização de um juiz.
“Não é admissível aqui, fora dos autos, que qualquer juiz seja diminuído ou desmoralizado. Como eu disse, onde um juiz for destratado, eu também sou. Qualquer um de nós juízes é. Esse Conselho, como todos os órgãos do Poder Judiciário, está cumprindo a sua função da melhor maneira e sabendo que nossos atos são questionáveis. Os meus, no Supremo, o juiz do Tribunal Regional do Trabalho, um juiz de primeira instância. Somos todos igualmente juízes brasileiros querendo cumprir nossas funções”, criticou Cármen Lúcia.
A presidente do STF concluiu seu discurso acrescentando que a categoria de magistrados jamais esquece a necessidade de se buscar harmonia entre os poderes.
“O mesmo respeito que nós do Poder Judiciário dedicamos a todos os órgãos da República, afinal somos sim independentes e estamos buscando a harmonia em benefício do cidadão brasileiro. Espero que isso não seja esquecido por ninguém, porque nós juízes não temos nos esquecido disso”, concluiu.
As declarações da presidente do STF são um recado ao Legislativo e ao presidente do Senado, Renan Calheiros, de que o Congresso pode discordar de decisões da Justiça, mas que não se deve tentar criar uma guerra entre os poderes para tentar desqualificar investigações que ainda estão em curso.
Segundo ministros do Supremo, o melhor caminho é o recurso contra decisões judiciais e, no máximo, declarações ponderadas questionando a validade de operações autorizadas pelo Judiciário.
A posição da ministra Cármen Lúcia é partilhada por outros colegas, mas não é unânime dentro do tribunal. O ministro Gilmar Mendes, por exemplo, tem feito críticas a ações da Operação Lava Jato, principalmente a medidas adotadas pelo Ministério Público.
Dentro do STF, considera-se que as críticas “ácidas” de Renan Calheiros foram muito mais corporativas e uma busca de tentar acuar os responsáveis pelas investigações que têm como alvo políticos. O próprio presidente do Senado é investigado pela Lava Jato.
A mesma posição é compartilhada por assessores do presidente Michel Temer, que não gostaram dos ataques feitos por Renan Calheiros ao ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, chamado pelo presidente do Senado de “chefete” de polícia.
O problema, reconhecem auxiliares de Temer, é que Moraes realmente acaba “falando demais” e cria embaraços e dificuldades para o Palácio do Planalto. Ou seja, apesar de não aprovarem o tom das críticas de Renan, avaliam que Moraes dá motivos para os ataques e acabará saindo do governo em breve.
Além disto, neste momento, Temer não quer criar um clima de animosidade com Renan Calheiros, porque depende dele para aprovar ainda neste ano o teto dos gastos públicos. Segundo um assessor, Temer praticamente liberou Renan a atacar o ministro da Justiça. Primeiro, porque Alexandre de Moraes deu motivos. Segundo, porque o presidente do Senado é mais importante para o governo do que o ministro da Justiça.

GABRIEL MASCARENHAS E VALDO CRUZ
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)