BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Senado decidiu na madrugada desta quarta-feira (10) tornar a presidente afastada, Dilma Rousseff, ré no processo de seu impeachment.
Foram 59 votos favoráveis e 21 contrários, sem nenhuma abstenção. Era preciso maioria simples (mais da metade dos senadores presentes) para que o parecer do relator Antonio Anastasia (PSDB-MG) fosse aprovado.
O resultado indica ser muito difícil Dilma conseguir barrar o impeachment na votação final, que deve ter início por volta do dia 25. Nesta ocasião, a petista perderá definitivamente o mandato caso pelo menos 54 dos 81 senadores votem nesse sentido.
A sessão começou às 9h44 e foi comandada pelo presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Ricardo Lewandowski.
Dilma é acusada de editar três decretos de créditos suplementares sem aval do Congresso e de usar verba de bancos federais em programas que deveriam ser bancados pelo Tesouro, as chamadas “pedaladas fiscais” -quando foram quitadas, em 2015, o valor pago foi de R$ 72,4 bilhões.
Caso a petista seja destituída, assume de forma efetiva o hoje interino Michel Temer, 75, o que coloca o PMDB no poder pela terceira vez em sua história, nenhuma delas pelo voto direto -José Sarney (1985-1990) e Itamar Franco (1992-1994) também eram vices.
Temer assumiu a Presidência da República interinamente em 12 de maio, quando o Senado decidiu afastar a petista.
VOTAÇÃO
O resultado foi proclamado antes do previsto inicialmente devido à articulação de senadores da base aliada para acelerar a fase de discursos. Alguns abriram mão, outros encurtaram a fala. O próprio presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), atuou diretamente para convencer alguns congressistas a desistirem de suas falas.
A sessão começou com 44 minutos de atraso e foi aberta por Renan, que passou o comando dos trabalhos para o presidente do Supremo.
De acordo com a legislação, o presidente do STF é o responsável por comandar o processo de impeachment e ninguém pode substituí-lo durante as longas horas de discussão.
Com esta votação, o Senado concluiu mais uma fase do processo de impeachment ao indicar os crimes cometidos por Dilma, que se torna ré. Esta foi a primeira decisão de caráter jurisdicional tomada pelo plenário do Senado neste processo.
“Antes de passar a presidência ao ministro Ricardo Lewandowski, apenas quero lembrar a gravidade da decisão que tomaremos logo mais. Que a façamos, tanto quanto possível, despidos de nossas convicções político-partidárias e imbuídos da responsabilidade advinda do papel de juízes que a Constituição Federal nos outorga”, afirmou Renan ao iniciar a sessão.
Lewandowski assumiu o posto e pediu que os senadores votassem com “coragem e independência”, “pautando-se exclusivamente pelos ditames das respectivas consciências e pelas normas constitucionais e legais que regem a matéria”.
A sessão começou com a apresentação de oito questionamentos feitos pelos senadores da oposição sobre o rito do processo. Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e Humberto Costa (PT-PE) pediram a suspensão do processo sob o argumento de que primeiro é preciso esclarecer a delação premiada do empreiteiro Marcelo Odebrecht. Ele afirmou ter repassado R$ 10 milhões em dinheiro para o PMDB em 2014 a pedido de Temer, segundo a revista “Veja”. Lewandowski rejeitou o pedido.
Durante os discursos, os aliados de Temer cravaram que os crimes cometidos por Dilma estão comprovados e avaliaram as melhorias que, de acordo com eles, aconteceram ao país após o afastamento da petista.
O senador José Agripino (DEM-GO) também rechaçou a pecha de golpista imposta pelos defensores de Dilma aos que defendem sua saída.
“Golpe é quando você tem avião voando, você tem tanque na rua, você tem baioneta exposta. Aqui não tem nada. O que tem aberta é a Constituição brasileira seguida à risca há nove meses e meio”, afirmou.
Favorável à condenação de Dilma, o senador Fernando Collor (PTC-AL), que também sofreu um processo de impeachment em 1992 quando presidia o país, afirmou que foi absolvido pelo STF mas não poupou a petista. Ele disse que ela se “desconectou da realidade” e se apartou da população. “Desde 2013 as infrações [orçamentárias] eram apontadas publicamente por órgãos de controle. O Palácio do Planalto tinha ciência dos avisos”, disse.
Já os aliados de Dilma voltaram a defender que a petista é inocente perante as acusações que recaem sobre ela sob o argumento de que a Comissão Especial que analisou o caso não conseguiu comprovar a culpa de Dilma.
“Não adianta quererem nos censurar, retirando das notas taquigráficas as palavras infâmia, fraude, porque diante da falta de embasamento jurídico de comprovação de crime de responsabilidade por parte da Presidenta Dilma, é, sim, um relatório fraudulento este apresentado pelo senador Anastasia”, protestou a senadora Fátima Bezerra (PT-RN).
Também contrário ao impeachment, o senador João Capiberibe (PSB-AP) afirmou que se sente “responsável pelo transe histórico” pelo que o país passa. “Eu bem poderia ter conversado mais, articulado mais, ter feito mais para evitar tanta incerteza, tanto retrocesso. Eu bem que tentei”, disse. Ele relembrou ainda que tentou conversar tanto com Dilma quanto com Temer, mas não obteve sucesso com nenhum dos dois.
IMPEACHMENT
Os senadores aprovaram o relatório condenatório do senador Antonio Anastasia (PSDB-MG), aliado do adversário derrotado por Dilma em 2014, o também senador e presidente tucano Aécio Neves (MG).
Agora, Dilma será julgada pelo Senado. Nesta fase do processo, a acusação e a defesa poderão indicar até seis testemunhas cada uma. Um dos autores da denúncia contra Dilma, Miguel Reale Júnior, afirmou que deverá chamar entre duas e três apenas.
A expectativa é de que esta fase dure cinco dias e ela também será comandada por Lewandowski.
Dilma é a segunda chefe de Estado a enfrentar formalmente um processo de impeachment desde a redemocratização, 24 anos após Fernando Collor -então no PRN, hoje no PTC-, que foi destituído em 1992.
Desde a era Vargas (1930-45), três presidentes eleitos pelo voto popular não terminaram seus mandatos. O próprio Getúlio, que se matou em 1954 em meio a uma crise política, Jânio Quadros, que renunciou no mesmo ano em que tomou posse (1961), e Collor. João Goulart, que foi eleito vice de Jânio e depois empossado na Presidência, acabou derrubado por um golpe militar em 1964.