Peça debate apedrejamento literal e virtual de mulheres

SÃO PAULO, SP, 23.03.2017: TEATRO-SP - Teatro Paulo Eiro, em Santo Amaro (zona sul de SP) que irá reabrir na noite desta quinta-feira, após passar por reformas entre 2011 a 2015, onde reabriu e precisou ser novamente fechado por problemas de infiltração de água no sub solo, onde se encontra o gerador. (Foto: Marco Ambrosio/FramePhoto/Folhapress)
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Durante suas pesquisas para “Isso Não É um Sacrifício”, espetáculo que estreia hoje (24) em São Paulo, Christiane Tricerri se deparou com uma contradição.
Assistiu a vídeos de apedrejamento de mulheres por radicais islâmicos e viu na violência daquele ato uma estranha poesia: aquelas mulheres, enterradas até a cintura e enroladas em gaze, sangravam lentamente com a agressão, e o vermelho tingia as ataduras como uma aquarela.
“[Os vídeos são] a coisa mais brutal que eu já vi, mas no teatro eu posso trabalhar com a brutalidade em contraponto com a fragilidade humana. Ir do brutal ao poético. Atingir os nervos, mas também o coração”, diz Tricerri, que assina a direção do monólogo escrito por Fernando Bonassi e interpretado por Fernanda D’Umbra.
Como em seu trabalho anterior, “A Merda” (2015), texto do italiano Cristian Ceresoli que expurga os males da sociedade de consumo, em “Isso Não É um Sacrifício” Tricerri segue com sua pesquisa sobre a brutalidade.
A peça transita da violência literal sofrida por mulheres à metafórica, como linchamentos na internet ou em pequenos atos cotidianos. É o “apedrejamento nosso de cada dia”, define a diretora.
“E como passamos de vítimas a algozes num piscar de olhos. Porque as reações [na internet] são muito imediatas. Isso me assusta muito.”
O texto dá margem a essas diversas interpretações (literais e metafóricas) da violência. “Você é apanhada de surpresa e arrancada do seu território. O território mais íntimo que era frequentado e agora é invadido. O último abrigo foi violado”, diz um trecho.
Como fez em “A Merda”, Tricerri coloca a atriz falando com um microfone. Não para ampliar a voz (trata-se de um espaço cênico diminuto), mas para que ela surja como um elemento musical.
D’Umbra é acompanhada em cena pelo guitarrista Jorge Jordão e pelo designer de som e diretor musical Rafael Bresciani, que executam ao vivo a trilha sonora. A música foi composta com as falas da atriz, para complementar ou interferir no que é dito. É um trabalho que Tricerri define como “teatro-concerto”.
Para o figurino, que também faz as vezes de cenário, Gal Oppido criou um longo tecido que parte do pescoço da atriz e se estende pelo palco. D’Umbra fica toda coberta, como se estivesse aprisionada, imóvel diante da violência.

Serviço:

ISSO NÃO É UM SACRIFÍCIO
QUANDO: sex., às 21h30; sáb., às 19h30; dom., às 18h30;
ONDE: Sesc Ipiranga, r. Bom Pastor, 822, tel. (11) 3340-2000
QUANTO: R$ 6 a R$ 20
CLASSIFICAÇÃO 14 anos