CEUs só saem se chegar dinheiro de privatizações

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Pouco mais de um ano à frente da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, Alexandre Schneider prevê um 2018 ainda de dificuldades orçamentárias -menores que as de 2017, mas ainda consideráveis, diz ele.
A retomada de obras paralisadas de 14 CEUs (Centros de Educação Unificada), por exemplo, depende do sucesso de privatizações previstas pelo prefeito João Doria (PSDB). Mesmo ao ressaltar esses desafios, Schneider comemora avanços. Cita a elaboração do currículo municipal, o projeto de tecnologia e expansão das creches.
“Fizemos um ajuste de mais de R$ 400 milhões. E mesmo assim cumprimos os acordos salariais com a categoria, chamamos quase 9.000 professores, fizemos ampliação em creche e retomamos obras paradas”, diz.
O secretário diz que continua atrás da promessa de Doria de criar até março 66 mil vagas em creche (novas 40 mil vagas em três meses). Nem sequer há orçamento para isso. “O prefeito já garantiu que tira da área que for”.

Pergunta – Qual o cenário para a área de educação municipal neste ano eleitoral?
Alexandre Schneider – A secretaria está melhor estruturada para as metas. Conseguimos estabelecer uma regulação para as creches, ter clareza dos mecanismos para criar vagas com qualidade. No ensino fundamental, estabelecemos sistema de avaliação, que possibilita politicas de equidade. Conseguimos nomear quase 9.000 professores, retomar obras, terminar o currículo da cidade, já tem o desenho das formações de professores. Quais dificuldades permanecem? O orçamento. Embora seja melhor que no ano passado, é muito difícil de ser gerenciado. Vamos ter problemas ainda este ano.

P – A gestão divulgou novas 26 mil vagas em creches em 2017. Todas foram ocupadas por crianças já no ano passado?
A.S. – Algumas ficaram para este ano, serão ocupadas até fevereiro. São matriculas em processo, sempre contabilizadas como vagas criadas. A expansão foi possível pela melhoria do nosso sistema e a reformulação do Leve Leite [o público beneficiado foi reduzido].
Com relação ao sistema, havia vagas contratadas mas não utilizadas. A prefeitura assumia um convênio para 250 crianças, reservava orçamento, mas só efetivava 200 [a verba ficava comprometida, embora não executada]. Ocorria porque o sistema só levava a um número pequeno de escolas para os pais escolherem. Ampliamos o número de possibilidades de escolha, mantendo o raio de 2 km da casa da família. Esse processo criou 7.000 vagas. E quando a gente teve clareza da economia com o Leve Leite, conseguiu gerar outras 19 mil vagas.

P – O prefeito prometeu criar 66 mil vagas até março. É possível ter 40 mil novas vagas de creche em três meses?
A.S. – O prefeito estabeleceu uma meta evidentemente ousada. A gente está trabalhando até o limite para chegar a 31 de março com essas vagas.

P – O tema envolve muitas famílias e gera expectativas. Ainda mais quando se trata de um prefeito que se coloca como diferente na capacidade de executar. As famílias não merecem ouvir se dá ou não dá?
A.S. – Em 2017, com as dificuldades com orçamento da educação, imaginei que não chegaria a esse número, mas nunca desistimos. Tanto que batemos o recorde para o primeiro ano de uma gestão. Não trabalhamos com outra hipótese se não a de cumprir a meta.

P – Com a previsão de R$ 2,3 bilhões para convênios de creches em 2018, não há nem orçamento para essas vagas [foram R$ 2 bilhões em 2017].
A.S. – Isso o prefeito já garantiu que tira da área que for. Nosso problema não é tanto o dinheiro, é a capacidade de ter os prédios, ter as organizações. A gente conseguiu gerar muita vaga porque não esperamos o dinheiro para procurar as entidades. Fizemos um movimento inédito de fazer um cadastro das entidades.

P – Todas as obras de creches e CEUS foram retomadas? Alguma foi iniciada nesta gestão?
A.S. – O que a gente já apontava ano passado era a retomada das obras existentes. As últimas [seis de 13 obras] vão ser retomadas agora com recurso do Estado. As obras dos CEUs dependem de um estudo da demanda, que a secretaria já entregou para a secretaria de obras. Tem CEUs propostos em áreas onde não há demanda escolar, como o do Tatuapé. E vai depender, a princípio, de recursos da privatização.

P – As obras dos CEUs dependem de privatizações?
A.S. – De dois recursos. Das privatizações e de recursos que estão sendo negociados com governo federal.

P – O sinal de internet é fraco nas escolas. Agora com o currículo de tecnologia, como a gestão pretende resolver isso?
A.S. – Muitas das atividades propostas no currículo não dependem de internet, como robótica. Mas o sinal vai melhorar. A prefeitura recebeu uma doação [em maio de 2017] de equipamentos utilizados nas Olimpíadas e agora negocia um termo de ajustamento de conduta [com uma empresa de telefonia] para viabilizar recursos para instalação.

P – As escolas vão receber novos equipamentos?
A.S. – Compramos computadores para todas as escolas de ensino fundamental, dos laboratórios à secretaria. Serão notebooks, e os alunos vão poder leva-los para sala, para projetos coletivos como propõe nosso currículo. São 17 mil máquinas e chegam às escolas até março. A gente também comprou kits de robótica, mínimo de três por escola. Os alunos vão ter aulas de programação desde o 1º ano, robótica, uso ético da tecnologia. Tudo isso configura um trabalho de tecnologia pioneiro no Brasil e, nessa escala, talvez no mundo.

P – A secretaria não prevê investimento específico de formação para o novo currículo, mas diretores da rede apontam em pesquisas que as formações atuais são deficientes. Será suficiente para que o currículo resulte no salto esperado?
A.S. – A gente acredita que a forma como o currículo foi construído, com participação de educadores e alunos, resultou em um processo mais legítimo. Fizemos o currículo olhando para a Base [Nacional Comum Curricular] e para a produção da própria rede. Isso cria um processo identitário relevante. É óbvio que o currículo não vai salvar a cidade, mas temos as orientações didáticas aos professores, alinhadas ao material de apoio e formação, uma preocupação constante de diálogo com a rede. Isso reforça a possibilidade do currículo ir para a sala de aula. Mais do que quanto a gente vai investir em formação, é como vai investir. E escolas mais vulneráveis receberão mais apoio.

P – Em 2017, o embate com o MBL em torno do projeto Escola sem Partido e o anúncio do prefeito de incluir a farinata [complemento alimentar] na merenda expuseram uma falta de sintonia com o prefeito. Qual a avaliação faz?
A.S. – O que eu tirei desses episódios é que só vale a pena ocupar uma posição pública se for para fazer valer nossos princípios: de que a escola tem de ser plural e que temos sempre de apostar numa burocracia pública de boa qualidade –o que temos na secretaria no caso da alimentação escolar. O prefeito, na farinata, teve a humildade de dar um passo atrás e reconhecer que nossa gestão foi um pouco açodada do ponto de vista da comunicação dessa possível adoção.

(Folhapress)
Foto: Divulgação